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2º Salão de Nacional de Pequenos Formatos de Britânia

O poder.

Segundo o filósofo polonês Zygmunt Bauman, a modernidade em sua forma mais consolidada exige a abolição de dúvidas e incertezas. É necessário um controle sobre a natureza, uma hierarquia burocrática e mais regras e regulamentos para fazer os aspectos caóticos da vida humana parecerem organizados e familiares.

Se assumirmos ler Bauman, desses tempos apocalípticos, o resultado é um estudo oráculo.

Hoje a modernidade, com suas certezas e controles, desaparece como a água entre nossos dedos. Modernidade líquida.

Sobre este assunto um tanto áspero, 6 dos artistas participantes do Salão falam conosco de suas obras.

Começamos nosso tour com Érica Storer e seu “RÕM-ÓFICE”. Um vídeo que por jocoso não nos resulta menos dramático. A referência e a angústia para a produtividade à custa de qualquer parco termo de fadiga humana. O tratamento do comediante e a disposição absurda dos elementos tornam este trabalho um deleite para a reflexão, de repente.

Dentro de uma casa em um cômodo sala cozinha, uma estrutura montada e amarrada uma na outra (bicicleta, cadeira, tabua de passar, caixa térmica, tablet, luz, entre outros) três mulheres em silêncio fazem uso da estrutura montada, uma pedala na bicicleta parada enquanto lê o tablet e faz anotações, a outra sentada na cadeira usa o celular e a última sentada em outra cadeira lê um livro.

Igualmente surpreendente e profético é o vídeo “Home Office”, de Renata Miranda. Feito algum tempo antes da terrível tragédia em Beirute, ele prevê explicitamente o evento. A arte é sempre um presságio.

Vídeo apresenta imagens em negativo com cores furta cor, vemos a imagem de uma mulher dirigindo uma moto em uma estrada rodeada de floresta até sua casa, depois de voltar do supermercado com vinho e mantimentos para cozinhar, ela faz seu trabalho desde casa, pelo computador, ao fim vemos imagens de prédios sendo detonados.

E as certezas da modernidade são desalojadas a cada passo, seja da configuração de demolidas emblemáticas, como no caso das “Pinturas para peito” de Gabriela Mutti, ou dos tecidos de Marcel Diogo.

Mutti tira a sacralidade do uniforme militar, que produz respeito, medo e obediência, e nos constrói algumas decorações fantasiosas deste mundo ferido por tantas desigualdades e controles.

Marcel Diogo, faz algo homólogo, as suas pinturas rompem o espaço emocional, para assinalar sem ambiguidades, a desagregação dos corpos repressivos.

E nessa mesma tensão emocional, como um jogo de espelhos infinitos, Amador e Jr Segurança, nos convidam a entender que o poder da modernidade está erradicado em vigiar e castigar.

Por fim, temos uma bela escultura, ou poema objeto, de Diogo Duda, “Something around eleven euros and thirty-nine cents”.

O país da banana, a moeda como fruto suculento do capital e seus mecanismos de ansiedade e fome.

O poder é uma patologia, nos diria Foucault.

Essas seis obras nos convidam a perceber essa premissa, mas a partir da saúde emocional. Na medida em que se produz a consciência da patologia, neste exato momento, é que se começa a curar.

Morella Jurado